terça-feira, 3 de dezembro de 2013

As alegrias de mudar de casa #2

Não sei se já fizeram uma mudança com recurso a uma empresa especializada. Eu já.
Há uma dinâmica na relação que se estabelece com os técnicos que contratamos para esta tarefa. E esta dinâmica organiza-se em quatro fases distintas.

Fase um: A estranheza
Começa por ser uma relação distante e estranha. Temos dentro de casa pessoas que nunca vimos. Estas pessoas estão a mexer nos nossos pertences, a levá-los escada abaixo, sabe-se lá bem para onde. Queremos confiar que tudo correrá pelo melhor, que tudo chegará completo e intacto, mas desconfiamos, porque na verdade ninguém sabe como é que aquilo vai acabar.
Esperamos o melhor, tememos o pior.

Fase dois: O enamoramento
Há então um estreitar de sentimentos. Afinal já conhecemos aqueles indivíduos há umas horas, quiçá já lhes oferecemos água ou uma cerveja esquecida no frigorifico. Já partilhámos momentos de angústia - como quando o sofá não dá a volta na escada, e agora? -, já vivemos grandes alegrias - como quando afinal, depois de 40 minutos de tentativas, lá se consegue fazer descer o sofá. Somos uma equipa unida. Trocamos olhares cúmplices. Já observámos que as nossas caixas estão a ser transportadas para a carrinha das mudanças e não entregues a um primo mafioso que ali anda a rondar. Relaxamos.
Somos agora companheiros de viagem, na epopeia que é fazer uma mudança.

Fase três: O declínio
Quando metade do dia já passou, e sobretudo quando contratamos uma mudança paga à hora, o nosso bom humor começa a desaparecer pouco depois da hora do almoço (assumindo que começámos de manhã). Estamos cansados porque passámos os últimos dias a fazer caixas e a embrulhar biblots que nem sabíamos que tínhamos. Somos incapazes de compreender porque raio precisam aqueles tipos de descansar 3 minutos depois de nos levarem o piano de cauda para casa. Já não há sorrisos, já não há conversa de circunstância.
E é mútuo. Eles também já não gostam de nós, não ligam aos avisos “FRÁGIL” escritos nas caixas da loiça. Atiram com tudo como se estivessem a fazer birra.
A relação está por um fio.

Fase quatro: Preciso de um duche, de uma caixa de chocolates e de um filme de amor
É então que a mudança termina. Estamos felizes e damos saltinhos. Alguns dão só por dentro, outros até exteriorizam. Não há nada que mais queiramos do que ficar na nossa nova toca, a sós com uma vida envolvida em plástico e cartão.
Já os técnicos podem finalmente ir fazer as suas coisas e não levar mais com os nossos bufos enervados de cada vez que uma caixa é pousada/atirada. Também eles estão felizes.
Antes de separarmos caminhos, chega o momento do pagamento. O temível momento em que descobrimos que gastámos quase tanto naquela operação (+ materiais + IVA + seilámaisoquê), do que na renda. E pagamos - que remédio - de nó na garganta e sorriso amarelo.
Dizemos adeus entredentes (já não somos amigos!), fechamos a porta e ficamos ali, no silêncio, a sentirmo-nos sujos, usados, a desejar comida calórica e um filme que justifique as lágrimas que precisamos de fazer correr. O fim nunca é fácil.

Mudar de casa é um processo merdoso. Já tinha dito, certo?
Preciso de chocolate. Preciso de muito, muito, mesmo muito chocolate.


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